Sempre quando ele se sentava para ler seus e-mails, ela se aproximava de mansinho. Fingia sentir saudades constantes, roubava-lhe um beijo – e ficava com os olhos bem postos nos movimentos dos seus dedos no teclado do computador. Tudo muito disfarçadamente. Com os dias, foi até adquirindo uma técnica pessoal. Às vezes, ela se aproximava para lhe servir um café, às vezes para mostrar uma nova idéia de figurino que montara para o desfile no qual andava trabalhando ultimamente. E foi assim por quatro semanas. Ela monitorava milimetricamente por onde se arrastavam aqueles dedos finos e longos, que lhe tocavam sua alma e seu corpo, e ainda a faziam estremecer, mesmo depois de sete anos de casamento. Seus dedos andavam à esquerda por uma vez - a senha deveria começar por s, f, g? Depois, rolavam deslizantes por mais duas letras à direita – o, l, m? Depois um triplo toque bem ao centro – j, u, b? E foi assim por quatro semanas. Quando ele ia digitar a senha, ela se aproximava. E quando ambos iam dormir, ela se punha a montar e desmontar palavras inexistentes, todo um vocabulário confuso dançava em sua mente, como se o alfabeto estivesse envolto em névoa, letrinhas de fumaça que ora se acumulavam em sua cabeça, turvando-lhe a visão, ora se dissipavam, abrindo possibilidades inexistentes de password, “folgyb”, “riobtv”, “soltun”, “açovjn”.
Quando acordava, mesmo antes de tomar café, seguia decisiva para o laptop, e divagava por todas as possibilidades consideradas mais plausíveis. E, algumas vezes, mesmo no meio da madrugada, corria ao computador, porque uma nova palavra lhe fazia algum sentido, e gritava em seu ouvido, pedindo para existir. Até que um dia, ela acertou. Ela acertou, foram apenas seis toques, e todo o universo virtual dele se abriu pra ela. Ela, um cão farejador de drogas, faminto, viciado. Ele, o ladrão, o traficante, o fraudador. O bandido.
E foi assim que ela descobriu tudo.
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